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"Nós por cá..."

SÓ A MURRO!

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segunda-feira, 21 de março de 2011

SEIS MENTIRAS. LEIA PARA AS CONHECER MELHOR E ASSIM SABER MELHOR O ESTADO EM QUE NOS ENCONTRAMOS!



"É preciso abrir as janelas para deixar sair o ar contaminado"

Por José Manuel Fernandes.


Ao fim de seis anos o país não está só economicamente arruinado, está também moralmente corroído
Primeiro que tudo é bom sabermos onde estamos. E onde estamos é simples de definir: não há memória de um governo ter conduzido o país a uma situação tão desesperada. Nunca, nos últimos 160 anos, a dívida pública, em percentagem do PIB, foi tão elevada. E a dívida externa é a maior dos últimos 120 anos, isto é, a maior desde que o país declarou bancarrota em 1892. Nunca, nos últimos 80 anos, o crescimento potencial da economia foi tão baixo (temos de regressar aos anos da I Guerra para vermos números tão maus). Nunca o desemprego foi tão elevado, nunca houve tantos desempregados de longa duração, nem tantos desempregados qualificados. E desde o início da década de 1970 que não se emigrava tanto, e só o rápido aumento do número dos que abandonam Portugal tem evitado uma taxa de desemprego ainda mais estrastrosférica. Tudo isto sucede depois de vários anos a divergir, de novo, da Europa e de, na "década perdida" de 2000-2010, Portugal ter sido o terceiro país do mundo crescer menos.
Convém ter estes dados bem presentes sempre que nos vêm com a ladainha da "crise internacional": esta só agravou o que já estava muito mal, esta só permitiu a acumulação de novos erros (como os dos orçamentos eleitoralistas de 2008 e 2009). É por isso que, ao contrário do que sugere José Sócrates (repetiu-o na entrevista à SIC), não é verdade que "o que se passa no nosso país passa-se nos outros países europeus", pois não há dificuldades semelhantes na Alemanha, na Holanda, na Áustria, na Dinamarca, na Suécia. A situação de Portugal só tem comparação com a da Grécia, em parte com a da Irlanda, e lá, como cá, tem a mesma justificação: governos irresponsáveis que fragilizaram os respectivos países ao ponto de estes ficarem à beira da bancarrota, quando estalou a crise internacional. Mas se esta não tivesse chegado, as crises grega, irlandesa e portuguesa não deixariam de ocorrer: estavam escritas nas estrelas da desgovernação.

O facto de existirem governos maus ou muito maus não é, em democracia, razão suficiente para se interromperem ciclos políticos. Mas já é se esses governos colocarem em causa aquilo que a nossa Constituição define como "regular funcionamento das instituições". Ora Portugal foi conduzido a um desses impasses por obra e graça da actual maioria e do seu chefe, um José Sócrates que tem da democracia uma visão instrumental em tudo semelhante à dos líderes autoritários. Isso voltou a ficar patente nos últimos dias, em que construiu mais uma teia de mentiras e de logros que um PS amestrado se tem apressado a repetir.

A primeira mentira é que Portugal não precisa de ajuda externa. Não só precisa, como já está a recebê-la. Se não fosse o Banco Central Europeu a emprestar aos bancos portugueses, estes já teriam secado. Se o mesmo BCE não tivesse andado a comprar títulos da dívida portuguesa no mercado secundário, esta não estaria entre os sete e os oito por cento, mas muito acima, talvez acima da Irlanda.
A segunda mentira é que Portugal não negociou o apoio externo, porque não o pediu. Na verdade, foi exactamente isso que o Governo português esteve a fazer nas últimas semanas, e, se não chegaram a Lisboa os senhores do FMI, estiveram por aí técnicos da Comissão Europeia e do BCE. Foram-se esses técnicos que se foram embora poucas horas antes de Teixeira dos Santos anunciar o PEC IV.
A terceira mentira é que Portugal decidiu "antecipar-se" e apresentar o PEC IV na cimeira de sexta-feira. Não foi isso que aconteceu. O que aconteceu foi que a missão da Comissão e do BCE detectaram um buraco nas contas de 2011 e preparavam-se para o reportar ao Euro grupo. Foi para evitar que isso sucedesse que Sócrates se precipitou. Tudo porque, como reconheceu na SIC, os cenários macroeconómicos do Banco de Portugal, do BCE e da Comissão "não eram tão bons" como os do Governo. Pois não: eram apenas realistas.
A quarta mentira é que o Governo está disposto a negociar as medidas, tal como esteve disposto a negociar uma coligação em 2009. Só que o que então foi uma farsa encenada é agora uma tragédia pontuada por proclamações grandiloquentes. Sócrates não quis negociar nessa altura, como tentou sabotar a negociação do Orçamento do Estado, como não quer negociar agora. Primeiro porque, como se assinala nos telegramas do WikiLeaks, não sabe partilhar o poder, nem sabe negociar. Depois, porque não suportaria ter de voltar a ceder ao PSD e ver este partido reivindicar pequenas vitórias. Finalmente, porque teme que por cada semana que passe seja maior a irritação do eleitorado e maior o futuro desastre eleitoral. Como sempre, é calculista.

A quinta mentira é que Portugal ficaria pior, se recorresse formalmente à ajuda externa. Porém, não ficaria pior nos juros que é obrigado a pagar, pois tanto a Grécia como a Irlanda já estão a pagar juros mais baixos. Também não é certo que ficasse pior nas medidas a tomar, pois Portugal já adoptou um ritmo de consolidação orçamental mais rápido do que o exigido a esses países. Por fim é até provável que ficasse melhor, pois não andaria de PEC em PEC e teria uma política mais coerente e não feita de ilusões entremeadas com sobressaltos.
A sexta e maior mentira de todas é a de que o nosso problema é a confiança dos mercados. Não é: o nosso maior problema é a incapacidade da nossa economia de crescer. Os mercados pedem juros mais elevados porque sabem que, continuando a crescer ao ritmo anémico da última década, Portugal não terá qualquer hipótese de pagar os juros da dívida, quanto mais de começar a amortizá-la. Os mercados sabem que emprestar a Portugal é muito mais arriscado do que emprestar à Alemanha, ou à Holanda, ou à República Checa, e não custa perceber porquê.

Pode-se viver muito tempo com mentiras destas, se elas não significarem o sistemático torpedear do funcionamento da democracia. Ora sucede que, para José Sócrates, a democracia não é o que devia ser - "regras que estabelecem como chegar à decisão política e não o que decidir", como escreveu Norberto Bobbio -, antes uma formalidade com que o seu formidável ego tem de transigir. As manobras dos últimos dias são apenas os mais recentes atropelos ao normal convívio institucional e tão-somente mais uma demonstração de que, nele, nunca é possível confiar. Não é possível selar um acordo com um aperto de mão, porque no minuto seguinte já o está a trair. Não é possível estabelecer princípios comuns, porque não tem princípios. Não é possível conversar porque só sabe gritar, uma sua especialidade parlamentar.

Nas últimas semanas têm-se sucedido situações que, só por si, teriam feito cair ministros, desde o episódio dos cartões únicos no dia das eleições até às condições em que a mulher do ministro da Justiça viu serem-lhe pagos, pelo ministério, 72 mil euros, passando por uma demissão por razões de perseguição política numa direcção regional do Ministério da Educação. Mas com Sócrates nada se passa. Há muito que, fiéis seguidores do "chefe", os seus ajudantes perderam qualquer noção de ética. E o pior é que esta degradação dos costumes políticos parece contaminar o país, onde já ninguém se indigna ou sobressalta.
Ao fim de seis anos o país não está só economicamente de pantanas - começa a estar moralmente corroído, começa a achar normal o que é anormal, começa a tolerar, ou mesmo a compreender e a justificar, comportamentos que qualquer democracia adulta rejeitaria com indignação. O estilo de Sócrates, a sua "combatividade" sem regras nem princípios, é a projecção no terreno da política dos métodos do projectista da Guarda, do licenciado da Independente e do ministro do Freeport. É um estilo que contamina tudo em redor e reduz a discussão pública às dicotomias tipicamente caudilhistas do "ou eu ou o caos".

É também por isso que, esgotada qualquer legitimidade, cortadas por vontade própria todas as pontes, a política portuguesa necessita de abrir as janelas e permitir a renovação do ar contaminado. Ao contrário do que parece conveniente dizer, nem todos são iguais e nem Sócrates é apenas mais um "entre eles". Tem de se regressar a uma política mais respirável, a um espaço público menos condicionado por jogadas baixas e jogos de spin, mas os tempos de crispação que vivemos só se ultrapassam removendo a infecção. Como no PS só Mário Soares parece ainda vivo, o acto higiénico passa por dar a voz aos eleitores. Todo o tempo que passar até lá é tempo perdido. Jornalista
Opinião
Um tiranete da Beira
Por Vasco Pulido Valente
O Eng. Sócrates comprometeu Portugal em Bruxelas com o PEC IV, sem comunicar coisa alguma ao Parlamento, ao Presidente da República, aos partidos da oposição e aos parceiros sociais. Quando umas tantas pessoas protestaram, o Eng. Sócrates respondeu, indignadamente, que o que lhe importava não era a "forma", era o "conteúdo" do que fizera. Só em Portugal esta explicação poderia ter passado sem um escândalo maior ou mesmo sem a demissão imediata do primeiro-ministro. Convém explicar porquê à ignorância indígena. A democracia é "forma". Só as ditaduras se justificam pelo "conteúdo". Uma ditadura não hesitará em invocar – como, de resto, invocou – a "defesa de Portugal" para meter por seu arbítrio os portugueses numa guerra colonial. A democracia, em que teoricamente vivemos, exige que se respeite a "forma", que em última análise legitima qualquer decisão política.

Não custa compreender esta diferença. A democracia assenta na "forma". O próprio princípio representativo não é mais do que uma "forma" ou, se quiserem, de uma convenção pela qual o eleitorado transfere a sua soberania para duas centenas de indivíduos que representam a sua vontade. O "conteúdo" da vontade dos representantes nem sempre corresponde ao "conteúdo" da vontade dos representados (dificuldade que, por exemplo, o mandato imperativo tentava evitar). Mas, se por acaso se puser em dúvida a "forma" do regime, não há maneira de fundar o menor acto de Governo, excepto no "conteúdo" que um ditador, inevitavelmente sustentado pela força, à altura lhe resolver dar.
O mesmo acontece com o Presidente da República. O Presidente existe para assegurar o equilíbrio e o "regular funcionamento" dos poderes do Estado. Por essa simples razão, nada lhe deve ser escondido. Também aqui se trata de uma "forma" que o Governo está obrigado a cumprir. A lei e a tradição não concedem ao Governo o privilégio de escolher o que revela ou não revela a Belém, conforme o "conteúdo" da informação de que dispõe. A "forma" prevalece para garantir o estatuto e a liberdade do Presidente e o exercício pleno das suas funções. Sócrates não percebe isto, e não por falta de inteligência, que já demonstrou, para nosso mal, numa ou noutra ocasião. Sócrates não percebe isto, porque não é e nunca foi um democrata. Resta saber se uma democracia aguenta indefinidamente e de boa saúde a autoridade de um tiranete da Beira.

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